segunda-feira, 15 de novembro de 2010

SOBRE O PRÊMIO JABUTI (A CARTA ABERTA DE SERGIO MACHADO) E OUTROS EXEMPLOS...

REFLEXÕES SOBRE O PRÊMIO JABUTI,
A PARTIR DA CARTA DO GRUPO RECORD


Prezados Leitores,

Aproveito o texto ao final desta mensagem (Carta aberta do Grupo Editorial Record sobre o Prêmio Jabuti), para convidá-los a uma importante reflexão.

Infelizmente, a obscuridade das ações neste País resvalou na literatura, maculando-a, afastando dos concursos literários e, portanto, de uma maior visibilidade, obras de qualidade, e escritores que merecem um espaço mais significativo de atuação no mercado editorial. Esta lamentável situação obstrui a já complicada trajetória de incentivo à leitura e à criação literária no Brasil.

Desde 2007, não inscrevo nenhuma obra em concursos literários, certamente desmotivada pela experiência traumática que o prêmio FUNARTE do referido ano me proporcionou. A mim e a tantos escritores, ainda crédulos nessas instituições artísticas. Sou poeta e ficcionista, premiada em diversos gêneros literários, nos âmbitos nacional e internacional. Portanto, não se trata de um depoimento puramente ressentido, mas depois do “caso Funarte”, fiquei bastante desestimulada para os investimentos materiais, de tempo e de energia, exigidos por concursos desse porte: No último dia de inscrição, 10/12/07, cheguei à FUNARTE com um projeto exaustivamente trabalhado, sete exemplares de livros, cinco DVD`s (síntese da minha carreira), ao todo 500 pp. encadernadas, atendendo completamente ao inumano edital.

A funcionária me comunicou que meu projeto, e todos os outros sobre sua mesa e espalhados pelo chão, só seriam encaminhados aos jurados no dia seguinte (11/12/07), e que o resultado seria publicado no Diário Oficial em 12/12/07. Meu trabalho, elaborado com esmero, assim como tantos outros, teria chegado (?) às mãos dos jurados no mesmo dia em que o resultado foi encaminhado à publicação em D.O. Os jurados foram contratados, com dinheiro público, para lerem e analisarem TODOS os projetos por COMPLETO. Nenhuma obra em processo de análise deve ser descartada antes que o estudo seja concluído. Mesmo que esta seja a prática, não deixa por isto de ser desrespeitosa. De que forma 500 projetos, inscritos no referido concurso, foram analisados por cinco jurados em três dias?

Este fato, que chegou aos jornais e à internet na época, provocando grande polêmica, hoje, três anos depois, infelizmente, soma-se a outros, neste Brasil onde os “nomes” vendem livros antes que os mesmos sejam gerados. Os “nomes” garantem espaços na mídia, em prateleiras de destaque nas livrarias, em contratos rápidos e receptivos com editoras, e em indicações para grandes prêmios, independentemente da qualidade de suas criações literárias.

Contudo, os “nomes”, incensados pela imprensa e absorvidos às pressas pelo leitor incauto, ou preguiçoso (o que não quer pesquisar outras riquezas), muitas vezes merecem o retorno valorizado de sua arte, pelo conteúdo das mesmas. No entanto, nem sempre há um vínculo justificável entre a ruidosa aclamação de um título no mercado e seu real valor literário.

Cada vez mais somos uma sociedade dominada pelo poder da imagem, das superfícies, das capas, das cascas e do marketing. O marketing: nada contra esta importante ferramenta. Mas tudo contra a palavrinha anterior: o poder. Este, sim, quando mal compreendido e utilizado, distorce, favorece minorias já privilegiadas, joga com interesses, faz política obscura, desmerece e atrofia a arte, a cultura, o artista e o povo.  

Meu assombro é grande com relação a esta desconcertante situação que envolve o Prêmio Jabuti. O maior e mais respeitado do País. Mas espero nunca perder a capacidade de me assombrar. Ela está intimamente ligada à minha crença no ser humano, à minha indignação diante das injustiças, à minha energia de luta, e à minha inesgotável capacidade de sonhar e criar.

Abraços,
Carmen Moreno

A CARTA:

Rio de Janeiro, 9 de Novembro de 2010


Exma. Sra. Rosely Boschini - Presidente da Câmara Brasileira do Livro


Exmo. Sr. José Luis Goldfarb - Presidente da Comissão do Prêmio Jabuti


Prezados Senhores,


O Grupo Editorial Record - composto pelas editoras Record, Bertrand, Civilização Brasileira, José Olympio, Best Seller e Verus - decidiu que não participará da próxima edição do Prêmio Jabuti para claramente manifestar sua discordância com os critérios de atribuição do Livro do Ano de ficção e não-ficção. Tais critérios não só permitem como têm sistematicamente conduzido à premiação de obras que não foram agraciadas em seleções prévias do próprio prêmio como as melhores em suas categorias.


Como editores preocupados com a Cultura e a ampliação da leitura no Brasil, nós entendemos que um prêmio literário visa a estimular a criação literária reconhecendo-a pelo critério exclusivo da qualidade. Não aceitamos - principalmente em um país como o nosso, onde quase sempre o mérito é posto em segundo plano - que o principal prêmio literário atribuído pelo setor editorial possa ser conferido a um livro que não esteja entre aqueles considerados os melhores em seus respectivos gêneros.


Infelizmente, a edição de 2010 do Jabuti não foi a primeira em que essa situação esdrúxula ocorreu. Em outra oportunidade, o mesmo agraciado deste ano preferiu não comparecer à entrega do prêmio, talvez por não se considerar merecedor da distinção. Grande constrangimento na cerimônia. Em 2008, a situação se repetiu, com o agravante de o então vencedor da categoria Melhor Romance do Jabuti ter conquistado também todos os outros prêmios literários conferidos no Brasil. O episódio causou tal estranheza e mal-estar que foi grande a repercussão na imprensa. Na época, passamos a acreditar que seriam feitos os necessários ajustes na premiação para que esses equívocos parassem de ocorrer.


Vimos, porém, que os critérios equivocados continuaram em vigor em 2010, com a diferença somente de o autor agraciado desta vez aceitar a láurea. Tomamos então a decisão de não mais compactuar com a comédia de erros. As normas do Jabuti desvirtuam o objetivo de qualquer prêmio, pondo em desigualdade os escritores que não sejam personagens mediáticos. Para não mencionar fato ainda mais grave: quando é evidente que a premiação foi pautada por critérios políticos, sejam da grande política nacional, sejam da pequena política do setor livreiro-editorial.


Como a inscrição das obras concorrentes ao Jabuti é um ato voluntário de cada Editora participante, e feito de forma onerosa, optamos não mais participar da premiação, até que as medidas necessárias para a correção de seu rumo sejam adotadas.


Atenciosamente,
Sergio Machado
Presidente
Grupo Editorial Record



ABAIXO, REGISTROS DA CAMPANHA PAIXÃO DE LER (POESIA NA ORLA)
































6 comentários:

  1. Carmen, não quero comentar a carta do Sr. Sérgio Machado que, diferentemente da vergonhosa situação do Prêmio Funarte, já conhecia o regulamento do Prêmio Jabuti e, portanto, não jogou no escuro, me parecendo, essa pós-atitude, um pouco constrangedora, sugerindo a mim outros interesses não-ditos. Embora colocando os dedos certos na ferida (no caso do Jabuti), há que se tomar muito cuidado com certos prêmios que oferecem uma quantia, digamos, incentivadora. Já ouvi muitos casos deprimentes sobre esse assunto e nada nesse mundo dos prêmios literários me causa mais espanto. Temos nós, escritores e poetas não afeitos ao poder, que não nos iludir com premiações, e continuarmos tentando construir a nossa obra como sendo o nosso maior prêmio. Assim como você conseguiu, premiada ou não, com o ouro de seu último livro, "LOJA DE AMORES USADOS". O Jabuti não o merece.
    Abraços fraternos, Tanussi Caqrdoso

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  2. Parabéns pelo texto, Carminha. Traduziu tudo o que de melhor poderia ser dito. Desanimador mesmo.

    Beijos


    Telma da Costa

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  3. Olá Carmen, visitei o blog e li as cartas. Realmente é para refletirmos, e muito.
    Também vi, com carinho, sua participação no Paixão de Ler. Amei! Parabéns!
    Há um grupo de Sala de Leitura que tem um blog "Tramas da Leitura", não sei se você conhece. Dê uma olhada. Elas estão sempre solicitando matérias para postar. Pensei que talvez fosse interessante um link no blog delas para o seu. O que você acha?
    Abç.
    Catharina

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  4. Obrigado, Carmen Moreno,
    pelas informações a respeito do Jabuti. Abraço Gilberto Mendonça Teles

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  5. Carmen querida,
    a vida inteira desconfiei dos prêmios e tenho razões para isso. Para mim só o tempo é julgador isento. Sempre pensei que prêmio nada acrescenta ao livro, bem como a ausência de prêmio nada subtrai ao livro. Sempre fugi de competições e nunca entendi porque ganhei alguns prêmios a não ser pela sorte. Para mim o esporte é mensurável, pelas regras estabelecidas do jogo, mas a arte pela complexidade e inegável poder de surpresa e liberdade, não.
    Muitos beijos. Astrid

    ATENÇÃO: ESTE E OS COMENTÁRIOS ACIMA, RECEBIDOS POR E-MAIL, FORAM POSTADOS PELA AUTORA DO BLOG.

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  6. O melhor prêmio para um poeta, são seus leitores.
    Parabéns pelo seu trabalho literário e sua Reflexão sobre o Prêmio Jabuti.
    Selmo Vasconcellos

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